by No bairro em que cresci, havia um boteco minúsculo em frente à pracinha que utilizávamos para as brincadeiras e partidas de futebol. Era lá que comprávamos refrigerante. Sua igualmente minúscula marquise também era o nosso refúgio nos fatídicos dias de chuva. O dono, Seu Elias, que andava pelo bairro com sua inconfundível bicicleta com um caixote amarrado na garupa, percebeu que podia lucrar mais com a molecada oferecendo outros itens além do refrigerante. Foi quando surgiu no boteco uma pequena TV preto e branco ligada a um Atari rodando River Raid.
Já era um jogo antiquíssimo, mas foi o suficiente para chamar a atenção da molecada. No entanto, como a primeira metade dos anos 90 já havia sido percorrida, logo aquela pequena gambiarra ficou abandonada em um cantinho do apertado boteco. Não dava para concorrer daquela forma com as locadoras que ofereciam jogos de Super Nintendo e Mega Drive. Mas Seu Elias não se daria por vencido. E ele atacou com absolutos clássicos.
Um dia, sem nenhum aviso, surgiram duas máquinas de arcade no boteco: Street Fighter e Mortal Kombat. Não sei ao certo as versões dos jogos rodando nas máquinas que ocupavam juntas uma porção considerável do cubículo, mas foi um tremendo sucesso. Suficiente para que o ramo do boteco mudasse gradativamente para se dedicar quase exclusivamente aos games. Claro, os refrigerantes permaneceram.
Com o tempo, outras máquinas surgiram, mesmo com Street Fighter reinando no local. Uma instantaneamente atraiu olhares em sua estreia. Era uma máquina com quatro controles, embora um deles não funcionasse muito bem. O jogo era de um sucesso da TV que todos conheciam: Tartarugas Ninjas. Mesmo sendo um pouco repetitivo, a máquina fez bastante sucesso pelo seu fator multiplayer. Infelizmente, ela não durou mais do que algumas poucas semanas no lugar. O pequeno espaço demandava uma rotatividade grande de máquinas e todas aquelas que não tivessem shoryukens ou fatalities rasgando as telas rapidamente eram substituídas.
Apesar do pouco contato, os momentos com esse arcade sempre estiveram na memória. Talvez pelo fator desenho, que eu gostava muito. No entanto, no longo período após essas jogatinas no boteco, o meu contato com as tartarugas basicamente se resumiu aos quadrinhos que foram lançados há alguns anos aqui no Brasil. Nos videogames, as coisas mudaram recentemente, com o lançamento de Teenage Mutant Ninja Turtles: Shredder’s Revenge. Confesso que não estava muito inteirado do lançamento, mas imediatamente o instalei e, anos depois, encarnei uma tartaruga com o controle novamente.
Segue os clássicos
Shredder’s Revenge é um jogo que bebe nos clássicos jogos de briga de rua de progressão lateral e mergulha profundamente na maluquice dos personagens da série e as igualmente malucas histórias que os cercam. Claro, é um jogo moderno, e dessa forma se afasta das práticas ruins dos antigos fliperamas, lar de alguns dos melhores jogos das tartarugas mutantes ninjas adolescentes que amam pizza e são lideradas por um rato. Esqueça, por exemplo, a dificuldade injusta dos jogos do passado.
A movimentação dos personagens é fluída e de fácil entendimento. No solo, você percorre os ambientes de forma rápida e precisa. É satisfatório desviar dos inimigos que surgem em tela, muitas vezes atacando em grupo e com movimentos sincronizados. Os comandos simples também ajudam no total domínio dos combates. E, embora simples, são variados e abrangem tudo o que o jogador espera de um jogo do estilo. Há os pulos duplos, agarrões, esquivas, ataques especiais, corridas, escapes e grandes poderes. O pacote completo. Até nos deslizes. Enfrentar inimigos voadores ou com golpes vindos do alto não é tão fácil, às vezes esbarrando numa lentidão ao levantar quando seu personagem cai. Mas nada grave.
São, no total, 16 fases, que podem ser completadas entre três e quatro horas de jogo no modo principal jogando nas dificuldades mais acessíveis. Os cenários vão desde ruas e rodovias urbanas, passando pelos esgotos, linhas de metrô, zoológicos e ambientes internos de prédios. Todos são impecáveis, cumprindo de maneira perfeita a ambientação do mundo das tartarugas. Os pequenos segredos escondidos são um show à parte, colocando um sorriso nos rostos dos fãs das tartarugas. Todas essas locações se dividem em dois tipos. Os estágios tradicionais, em que você caminha da esquerda para a direita, ditando o ritmo da pancadaria, e as de rolagem automática, em que seu personagem monta um hoverboard, aumentando a velocidade da aventura.
Além do grupo principal de tartarugas, o jogador pode escolher encarnar o Mestre Splinter, o vigilante Casey Jones e a destemida repórter April O’Neil. Cada um deles possui habilidades únicas, dando ao jogador um cardápio de diferentes estratégias para completar o jogo. E não apenas os golpes e habilidades mudam. As animações e detalhes de cada um são únicos, o que diminui a sensação de mais do mesmo, contribuindo para um bom fator repetição. No modo multiplayer, para até seis jogadores simultâneos, há golpes especiais em equipe, que se são difíceis de coordenar, são muito divertidos quando acontecem.
Completando o ótimo jogo, as músicas também se destacam. Remetendo ao antigo desenho e aos jogos clássicos, os mais velhos vão reconhecer cada uma das faixas, e mesmo as inteiramente originais passam uma boa sensação de nostalgia. Todas elas tornam o jogo uma festa completamente maluca e estereotipada dos anos noventa. No quesito vozes dos personagens, o jogo não brilha. Os pouquíssimos diálogos dublados são abafados de um modo que não parece intencional.
Conclusão
Teenage Mutant Ninja Turtles: Shredder’s Revenge é uma grata surpresa. Perfeito para a jogatina solitária e também para reunir os amigos num multiplayer online divertido. Com visual lindão e controles muito competentes, o game é como o Japão nos documentários de TV, uma mistura de nostalgia, tradição e modernidade.
Aliás, saudades do boteco do Seu Elias.
Teenage Mutant Ninja Turtles: Shredder’s Revenge
Desenvolvido por Tribute Games
Publicado por Dotemu, Gamera Games
Jogado no PC via 
Steam
steampowered.com/app/1361510 
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Idioma português
